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quarta-feira, 15 de maio de 2013

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: REFLETINDO SOBRE AS ATUAIS CONTROVÉRSIAS



ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO: REFLETINDO SOBRE AS ATUAIS
                                             CONTROVÉRSIAS


Lúcia Lins Browne Rego

Ao longo dos anos a alfabetização escolar tem sido alvo de inúmeras controvérsias

teóricas e metodológicas, exigindo que a escola e, sobretudo, aqueles profissionais que

lidam com o desafio de alfabetizar se posicionem em relação às mesmas, o que certamente

terá conseqüências para as práticas pedagógicas que irão adotar.

No Brasil, durante décadas predominou a discussão acerca da eficácia dos métodos

de alfabetização, gerando-se confrontos entre os chamados métodos sintéticos e analíticos

chegando-se a uma combinação de ambos nos chamados métodos analítico- sintéticos como

é o caso da palavração. Para prevenir as inevitáveis diferenças individuais na aprendizagem

inicial da leitura e da escrita e evitar os eventuais fracassos que os métodos em si não eram

capazes de contornar, elegeu-se um conjunto de pré-requisitos para uma alfabetização bem

sucedida, privilegiando-se principalmente uma maturidade dos aspectos perceptuais e

motores aliada a um domínio da linguagem oral.

Toda esta tradição estava vinculada a uma concepção de alfabetização segundo a

qual, a aprendizagem inicial da leitura e da escrita tinha como foco fazer o aluno chegar ao

reconhecimento das palavras garantindo-lhe o domínio das correspondências fonográficas.

No máximo, buscou-se assegurar, de acordo com algumas abordagens, que este saber se

desenvolvesse num universo de palavras que fossem significativas para o aluno no seu meio

cultural, como nas famosas cartilhas regionais. Mas de uma maneira geral, tratava-se de

uma visão comportamental da aprendizagem que era considerada de natureza cumulativa,

baseada na cópia, na repetição e no reforço. A grande ênfase era nas associações e na

memorização das correspondências fonográficas, pois se desconhecia a importância de a

criança desenvolver a sua compreensão do funcionamento do sistema de escrita alfabética e

de saber usá-lo desde o início em situações reais de comunicação.

A partir de 1980 a alfabetização escolar no Brasil começou a passar por novos

questionamentos, porém desta feita o foco das discussões era a emergência de novas

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concepções de alfabetização, baseadas em resultados de pesquisas na área da psicologia

cognitiva e da psicolingüística que apontavam para a necessidade de se compreender o

funcionamento dos sistemas alfabéticos de escrita e de se saber utilizá-lo em situações reais

de comunicação escrita, prevenindo-se desde o início da alfabetização o chamado

analfabetismo funcional.

Com a divulgação das pesquisas sobre a psicogênese da língua escrita (Ferreiro e

Teberosky 1986) o enfoque construtivista tornou-se, sem dúvida, um dos mais influentes na

elaboração de novas propostas de alfabetização, pois além de revelar a evolução conceitual

por que passam as crianças até compreenderem como funciona o nosso sistema de escrita,

incorporou a idéia defendida por Goodmann (1967) e Smith (1971) de que ler e escrever

são atividades comunicativas e que devem, portanto, ocorrer através de textos reais onde o

leitor ou escritor lança mão de seus conhecimentos da língua por se tratar de uma

estrutura integrada, na qual os aspectos sintáticos, semânticos e fonológicos interagem

para que se possa atribuir significado ao que está graficamente representado nos textos

escritos.

A importância das práticas sociais de leitura e escrita também teve o suporte dos

estudos que no âmbito da lingüística, da sociolingüística e da psicolingüística enfatizaram

as diferenças entre as modalidades língua oral e língua escrita e demonstraram como muitas

crianças se apropriavam da linguagem escrita através do contato com diferentes gêneros

textuais, explorando através de suas interações com adultos alfabetizados a leitura e a

produção de textos, mesmo antes de estarem alfabetizadas de forma convencional enquanto

que outras, apesar de alfabetizadas, apresentavam uma ausência de domínio da linguagem

utilizada nas formas escritas de comunicação. ( Rego 1986, 1988; Abaurre 1986; Kato

1987).

Um estudo longitudinal conduzido em Bristol (Wells 1986) mostrou, de forma

contundente, a importância das experiências com a leitura de histórias para crianças de préescolar

para o posterior sucesso escolar das crianças com a leitura e a escrita. Aquelas

crianças, cujos pais liam regularmente e exploravam conjuntamente com elas os textos

narrativos, não só aprenderam a ler com mais facilidade como revelaram-se excelentes

escritores no término do ensino fundamental. Os resultados obtidos neste estudo levaram o

autor a salientar aquelas variáveis que do ponto de vista sócio-cultural seriam mediadoras

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das diferenças de desempenho na escola, pondo em destaque a leitura em voz alta pelo

adulto e as experiências precoces com livros.

Neste período emergiu também um vasto corpo de pesquisas que investigavam a

relação entre o desenvolvimento de uma capacidade para refletir sobre as unidades sonoras

das palavras e as diferenças individuais na aprendizagem inicial da leitura e da escrita em

sistemas alfabéticos de escrita ( Carraher e Rego 1980, 1984, Cardoso- Martins 1990).

No entanto, na literatura científica internacional as relações entre esta capacidade

denominada de consciência fonológica e a aprendizagem da leitura e da escrita tem sido

objeto de muitas controvérsias. Para alguns pesquisadores a capacidade de refletir sobre

fonemas é uma conseqüência da exposição à aprendizagem de sistemas alfabéticos de

escrita, pois sendo o fonema uma unidade abstrata, as escritas alfabéticas só poderiam ser

aprendidas através do ensino explícito sobre essas unidades e sua relação com as letras do

alfabeto. Entre os defensores desta posição estão os pesquisadores do grupo de Bruxelas

cujas investigações focaram principalmente em comparações entre adultos alfabetizados e

analfabetos ( Morais, Cary, Alegria e Bertelson 1979; Morais, Cluytens, Alegria e Content

1989) e em estudos de treinamento (Content , Kolinsky, Morais e Bertelson (1986) para

ensinar crianças de 4 a 5 anos a segmentar fonemas. Estes estudos tiveram resultados

pouco consistentes em relação às crianças mais novas, uma vez que em tais treinamentos

se partia do pressuposto de que seria possível ensinar sobre fonemas independentemente do

nível evolutivo do aprendiz.

O argumento do grupo de Bruxelas está centrado no fonema, mas há outras

dimensões da consciência fonológica como, por exemplo, as segmentações intra-silábicas,

envolvendo o fonema inicial e a rima e a segmentação silábica. A capacidade para

segmentar e, sobretudo, para categorizar essas unidades, percebendo semelhanças e

diferenças entre as mesmas, se desenvolve antes de a criança se tornar alfabetizada e seria

preditora do sucesso na aprendizagem posterior da leitura e da escrita ( Bradley e Bryant

1987, Goswami e Bryant 1990).

Os resultados emergentes destas pesquisas foram até certo ponto desconsiderados

pelos defensores da abordagem psicogenética, pois estes pesquisadores embora reconheçam

que as crianças desenvolvem capacidades metafonológicas, isto é, se tornam capazes de

refletir sobre os segmentos sonoros das palavras (Ferreiro 2004), argumentam que a

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grande maioria dos estudos que investigaram a consciência fonológica e a sua conexão

com a aquisição da língua escrita ignoraram o processo evolutivo descrito na psicogênese

da língua escrita e que seria através da atividade de escrita e da busca por fazer

corresponder a segmentação oral com a segmentação gráfica que ocorreria a tomada de

consciência dos elementos sonoros da palavra e o desenvolvimento da consciência

fonológica.

Embora haja evidências para a existência de uma conexão entre o desenvolvimento

da consciência fonológica e a psicogênese da escrita em crianças falantes do inglês ( Rego

1991) do espanhol ( Vernon Calderón e Alvorado 2001) e, recentemente, do português

(Morais e Leite 2005) não podemos ignorar os resultados de dois estudos clássicos de

intervenção que demonstraram os benefícios de uma estimulação precoce da consciência

fonológica na aprendizagem da leitura e da escrita.

O primeiro deles foi conduzido por Bradley e Bryant (1983) e envolveu um grupo

de 65 crianças inglesas cujo desempenho em tarefas que exigiam reflexão sobre as

diferenças e semelhanças entre os sons iniciais e finais das palavras aos cinco anos de

idade, era muito precário. As crianças foram divididas em quatro grupos: dois

experimentais e dois de controle. Entre os 6 e 7 anos as crianças dos grupos experimentais

participaram de atividades de estímulo à consciência fonológica. No primeiro grupo

experimental as crianças foram apenas ensinadas a categorizar os sons iniciais e finais das

palavras quanto à sua semelhança enquanto que no segundo grupo além desse tipo de

estímulo elas foram ensinadas acerca das relações entre esses sons e as letras. Nos grupos

controle não houve estimulação à consciência fonológica: um deles seguiu a metodologia

normal da escola enquanto que o segundo recebeu um treinamento que consistia em

classificar palavras em famílias semânticas. Os resultados demonstraram que as crianças

que participaram das atividades de estímulo à consciência fonológica tiveram desempenho

superior em leitura e escrita, comparativamente aos demais grupos e que esta diferença foi

significativa para o grupo que foi ensinado sobre as relações entre os sons e a escrita das

palavras alvo.

O segundo tipo de evidência vem de um estudo conduzido na Dinamarca por

Lundberg, Frost e Petersen (1988). O estudo envolveu crianças de pre-escolar que foram

submetidas a um amplo programa de estímulo à consciência fonológica através de jogos e

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brincadeiras que se iniciavam com unidades maiores como rimas e sílabas e desciam até o

nível do fonema. Este grupo de intervenção, após uma ano de participação no programa,

demonstrou desempenho significativamente superior não só em tarefas de consciência

fonológica como em leitura e escrita comparativamente a outro grupo de pré-escolares que

embora no início do estudo tivesse demonstrado capacidades metafonológicas mais

desenvolvidas, não foram submetidos ao programa de intervenção pedagógica em apreço.

Os pesquisadores avaliaram também os conhecimentos de matemática de ambos os grupos

não tendo sido constatadas diferenças entre os mesmos quanto a esta área de conhecimento.

Se concebermos que o desenvolvimento da consciência fonológica é mera

conseqüência da aprendizagem da leitura e da escrita ou da evolução psicogenética da

criança a nossa postura pedagógica será a de que não necessitaremos de atividades

específicas que estimulem esse tipo de reflexão, porém se considerarmos que o

desenvolvimento da consciência fonológica é um facilitador da evolução psicogenética e da

aprendizagem da leitura e da escrita transformaremos este tipo de reflexão num alvo

pedagógico durante o processo de alfabetização.

Portanto, as pesquisas emergentes a partir de 1980 e as concepções teóricas

adotadas deram margem à proposição de modelos pedagógicos diferenciados de

alfabetização: alguns com ênfase muito forte no processo de letramento: uso de práticas de

leitura e escrita na sala de aula e outros que consideraram a necessidade de atividades

específicas de alfabetização e que reconheceram a importância de acatar os resultados

oriundos da literatura que investigou o impacto do estímulo à consciência fonológica sobre

a aprendizagem de escritas alfabéticas.

A proposta construtivista influenciada pelas pesquisas de Ferreiro e Teberosky

(1986) e pelos modelos de leitura propostos por Goodmann (1967) e Smith (1971) defende

uma alfabetização contextualizada e significativa através da transposição didática das

práticas sociais da leitura e da escrita para a sala de aula e considera a descoberta do

princípio alfabético como uma conseqüência da exposição aos usos da leitura e da escrita

que devem ocorrer de uma forma reflexiva a partir da apresentação de situações problema

nas quais os alunos revelem espontaneamente as suas hipóteses e sejam levados a pensar

sobre a escrita, cabendo ao professor o papel de intervir de forma a tornar mais efetiva esta

reflexão.

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Nesta perspectiva, a alfabetização dar-se-ia através de uma profunda imersão das

crianças nas práticas sociais de leitura e escrita, descartando-se qualquer tipo de atividade

didática que não estivessem vinculadas a essas práticas. Para Teberosky (1994) a formação

de um vocabulário estável de palavras a partir dessas práticas seria o principal referencial

da criança para a descoberta do sistema alfabético, uma vez que esta dar-se-ia a partir dos

conflitos vivenciados pela criança entre a sua concepção original de escrita e a escrita

convencional dos nomes. Para os adeptos desta corrente, não haveria necessidade de estudo

sistemático das correspondências som-grafia nem de atividades de estímulo à consciência

fonológica uma vez que esta seria uma conseqüência da própria evolução conceitual da

criança em face de uma aprendizagem reflexiva da leitura e da escrita.

Esta foi a proposta que se incorporou aos Parâmetros Curriculares Nacionais para o

Ensino Fundamental e aos Referenciais Curriculares para a Educação Infantil.

Recentemente, Morais e Kolinsky (2004) e um grupo de pesquisadores brasileiros

contestaram a proposta construtivista, retirando do foco inicial da alfabetização a

importância das práticas sociais de leitura e escrita e definindo como objetivo inicial da

alfabetização o domínio do sistema alfabético mediante uma metodologia voltada para o

ensino explícito das correspondências entre fonemas e grafemas inclusive de regras

ortográficas contextuais. A proposta se baseia em modelos cognitivistas de processamento

da informação na leitura de orientação ascendente, segundo os quais o reconhecimento

automático de palavras é o fator que melhor explica a compreensão na leitura. Este modelo

tem sido defendido por autores como Gough e Tunmer 1980, Perfetti ( 1985), Stanovich

(1980) entre outros, para os quais o uso de pistas contextuais na leitura é uma estratégia

compensatória característica dos leitores ineficientes.

Subjacente a esta proposta há um retorno explícito ao método fônico e a um modelo

de alfabetização restrito ao reconhecimento de palavras, onde prevalece o ensino direto,

independentemente dos níveis conceituais da criança, ou seja , da sua compreensão acerca

do sistema alfabético de escrita. Para esta proposta as diferenças entre língua oral e língua

escrita e os usos que fazemos da comunicação escrita também são irrelevantes.

No entanto, temos que ter cautela com a polêmica estabelecida entre alfabetização e

letramento a partir das propostas que descrevemos sumariamente acima. Poderíamos de

certa forma antecipar que uma prática pedagógica focada principalmente no estudo das

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correspondências fonográficas não seria suficiente para produzir uma alfabetização de

qualidade, uma vez que a leitura e a escrita são ferramentas culturais praticamente

inexistentes nas famílias de uma considerável maioria das crianças que freqüentam muitas

das nossas escolas públicas, dado o nível de escolaridade dos seus familiares. Portanto, as

práticas sociais de leitura e escrita teriam que ser enfocadas do ponto de vista pedagógico,

sob pena de tornar a aprendizagem da leitura e da escrita pouco significativa para a criança,

privando-a do acesso a formas de comunicação que só aparecem nos textos escritos.

Se por um lado, não podemos descartar a importância das práticas sócio-culturais

da leitura e a apropriação da língua escrita enquanto forma de comunicação, temos que

considerar que também é um fato incontestável, que só a partir da descoberta do princípio

alfabético e das convenções ortográficas formamos um leitor e escritor autônomo.

Portanto, temos defendido uma proposta pedagógica que dê suporte ao pleno

desenvolvimento desses dois aspectos envolvidos na aprendizagem da leitura e da escrita

desde o início da escolaridade, distribuindo o tempo pedagógico de forma equilibrada e

individualizada entre atividades que estimulem esses dois componentes: a língua através de

seus usos sociais e o sistema de escrita através de atividades que estimulem a consciência

fonológica e evidencie de forma mais direta para a criança as relações existentes entre as

unidades sonoras da palavra e sua forma gráfica (Ver Rego 1986, 1988).

É preciso ter em mente que a grande maioria das nossas crianças só ingressam na

escola após os seis anos de idade. Portanto, não há porque protelar o desenvolvimento de

um leitor mais autônomo em nome de um prolongado processo de letramento, se há

evidências na literatura científica de que atividades que estimulam de forma mais

sistemática o desenvolvimento da consciência fonológica afetam positivamente a

aprendizagem da leitura e da escrita, sobretudo quando esta estimulação vem associada à

palavra escrita através de jogos e atividades especificamente dirigidas para tal.

No Brasil, foram poucos os estudos que se preocuparam em investigar

empiricamente os efeitos produzidos pelas inovações pedagógicas introduzidas na

alfabetização de crianças a partir de 1980. Para tal, seria necessário comparar as

habilidades de leitura e escrita desenvolvidas por crianças submetidas a diferentes

metodologias de alfabetização. Um dos estudos pioneiros nessa direção foi produzido por

Rego e Dubeux (1994). Este estudo comparou grupos de crianças de duas escolas públicas

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submetidas a metodologias de alfabetização diferenciadas. As escolas estavam situadas no

mesmo bairro e em ambas as escolas havia oferta de pré-escolar, isto é, as crianças

ingressavam aos quatro anos de idade. Na escola 1 as crianças de pré-escolar não estavam

expostas a atividades de leitura e escrita, apenas se cuidava de trabalhar a tradicional

prontidão para a alfabetização através de atividades de coordenação motora e de

discriminação visual e auditiva. Não havia livros nem experiências com leitura e escrita. Na

escola 2 foi realizada uma intervenção pedagógica que alterou a forma como se trabalhava

a preparação para a alfabetização e a alfabetização propriamente dita. A intervenção

pedagógiga estruturou-se em torno de três eixos: leitura diária de histórias desde o início da

pré-escola, atividades de escrita de palavras que as crianças estavam interessadas em

aprender e atividades de estímulo à consciência fonológica através de jogos que

evidenciavam as semelhanças e as diferenças sonoras entre as palavras. Na escola 1, 80%

das crianças concluíram a pré-escola sem estabelecer relações entre as letras e os sons nas

palavras enquanto que na escola 2 apenas 25% das crianças permaneceram neste nível de

desempenho. Na escola 1 , embora no final da primeira série 90% das crianças tivessem

atingido o nível alfabético de escrita apenas 2% delas conseguiram ler e compreender um

pequeno texto e 18% conseguiram produzir um pequeno texto. Além disso, 43% das

crianças que estavam matriculadas no início do ano abandonaram a escola antes do final do

ano letivo. Na escola 2 apenas 5% das crianças concluíram a primeira série no nível présilábico,

isto é, sem estabelecer relações entre letras e sons, enquanto o percentual de

evasão foi de 10%. A grande maioria das crianças se encontravam no nível alfabético

(65%) e destas 35% produziam textos e 20% liam com compreensão. Portanto, a qualidade

do desempenho em leitura e escrita das crianças que haviam atingido o nível alfabético era

significativamente superior ao observado na escola 1.

Num estudo semelhante, porém metodologicamente mais rigoroso, Nunes (1995)

comparou o desempenho em leitura e escrita de grupos de crianças de classe média alta

alfabetizadas por diferentes metodologias: a que tradicionalmente focava no aprendizado

das correspondências fonográficas adotada pela Escola A e a que conciliava atividades de

alfabetização e letramento, enfatizando o trabalho com leitura e produção de texto, usada

na Escola B. As comparações efetuadas por Nunes demonstraram uma superioridade das

crianças da Escola B na produção de texto e uma maior relação entre leitura e compreensão

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de texto nesta escola. As crianças da escola A embora demonstrassem um maior

conhecimento da ortografia no reconhecimento e na escrita de palavras não apresentaram

desempenho superior em compreensão e produção de textos.

Nos dois estudos acima mencionados, as escolas inovadoras estavam vivenciando

uma metodologia de natureza mista em que havia tanto atividades de letramento como

atividades de alfabetização propriamente dita. Não havia ascendência do letramento sobre

a alfabetização nem vice-versa. Há, portanto, alguma evidência dos efeitos benéficos que

uma abordagem mais abrangente da alfabetização tem sobre a qualidade do desempenho

inicial das crianças em leitura e escrita. São estudos desta natureza, que poderão dar o

suporte empírico necessário à posição defendida por Soares (2004) e que nos parece

bastante sensata quando afirma que:

“Alfabetizar letrando ou letrar alfabetizando pela integração e pela articulação das

várias facetas do processo de aprendizagem inicial da língua escrita é sem dúvida o

caminho para superação dos problemas que vimos enfrentando nesta etapa da

escolarização; descaminhos serão tentativas de voltar a privilegiar esta ou aquela faceta

como se fez no passado, como se faz hoje, sempre resultando no reiterado fracasso da

escola brasileira em dar às crianças acesso efetivo ao mundo da escrita.”

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